sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Se há uma frase que resume Inland Empire (Império dos Sonhos), novo filme de David Lynch, ela foi escrita por Clarice Lispector:


Suponho que me entender não é uma questão de inteligência e sim de sentir, de entrar em contato... Ou toca, ou não toca

A pedra no vidro

Ontem fiquei conversando com uma amiga minha sobre essa questão dos homens que ficam abordando mulheres na rua. Ela contou que a mãe dela certa vez estava andando em uma calçada, quando um sujeito de baixo nível em seu automóvel começou a falar coisas desagradáveis e chulas. A mulher passava em frente a uma construção e não teve dúvida: pegou a primeira pedra que enxergou e jogou no vidro do carro do homem, que se espatifou. O cara fugiu e todos na rua a aplaudiram.

Logicamente, esse tipo de atitude é extremamente perigosa e pode muitas vezes acabar piorando a situação para a mulher, mas a mãe da minha amiga definitivamente foi muito corajosa. Se todas as mulheres reagissem assim, que home se atreveria a falar um "a"?

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007



Foto: Joana Saramago

Pelo direito de ir e vir (sem ser incomodada)

Estou prestes a lançar uma campanha de repressão contra homens cretinos que desrespeitam as mulheres em seu cotidiano. Não falo daqueles bêbados que espancam suas esposas e nem de estupradores, pois contra eles já existe uma sociedade inteira se mobilizando. Falo aqui daqueles inconvenientes que perdem todas as oportunidades de ficarem calados quando passa uma mulher, seja ela bonita, feia, gorda ou magra, jovem ou velha, mas desde que seja mulher. Falo daqueles infelizes que gastam saliva dizendo bobagens como “oi”, “linda”, “gostosa” e emitem sons com a boca como se estivessem com dor de dente.

Não há nada mais desagradável para uma mulher do que isso. Quer dizer, algumas podem até gostar e sentirem a auto-estima um pouco elevada, mas creio que a maioria detesta e se sente extremamente invadida e desrespeitada. Se não a maioria, pelo menos eu me sinto. Não há motivos para essa deselegância masculina; os homens simplesmente agem dessa maneira estúpida para terem certeza de que existe um pênis no meio de suas pernas. Se eles não provocam mulheres andando na rua, não são homens. Para mim, são uns desclassificados.

É por isso que eu acho que a mulher deveria ter o direito de manifestar seu repúdio contra tais atitudes da maneira que julgasse melhor. Certo dia, estava voltando para casa caminhando na calçada e dois trogloditas, no trânsito, vinham me acompanhando na mesma velocidade em que eu andava e me falando frases esdrúxulas. Fui andando e olhando para o chão procurando uma pedra para tacar no vidro do carro deles, mas pensei que isso seria um tanto quanto inconseqüente. Então, pensei que eu deveria ter esse direito. Não exatamente ter o direito de jogar uma pedra e arrebentar o carro do indivíduo, mas caso eu fosse tomada por esse impulso e fizesse algo do tipo, que existisse uma lei que me amparasse e protegesse. A justiça deveria estar ao nosso lado nessas ocasiões. Nunca vi uma mulher reagir a isso, talvez pelo fato de temer sofrer algum tipo de violência. A maioria finge não ter visto, quando deveria reagir, dizer algo, se defender, porque isso é um verdadeiro desrespeito à liberdade de ir e vir da mulher. Uma mulher não consegue andar na rua tranqüilamente sem ouvir qualquer coisa do gênero.

Mas enquanto a mulher não tem ao seu lado leis que a defenda de tais insultos – isso nem mesmo é cogitado - eu conclamo as mulheres que se sentem ofendidas com esse tipo de coisa a responderem a essas ofensas. Se o cara der “oi”, responda que não o conhece e não tem nenhum motivo para cumprimentá-lo. Responda ao nível da ofensa. Se disser “saúde” pergunte se está doente. Se emitir sons com a boca, pergunta se está com dor de dente. E se o cara falar algo de baixo nível, pegue pesado também e comece a gritar no meio da rua, grite para todos que estiverem ao redor que você foi assediada.

Se o machismo ainda existe, muito é porque as mulheres ainda aceitam determinadas atitudes dos homens e acham normal. Antes de pensar em acabar com o machismo nos homens (creio que isso seja um problema social e não de gênero), as próprias mulheres devem se libertar desse costume e fazer alguma coisa, nem que seja simplesmente dizer a eles que não acha normal.

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Tropa de Elite: osso duro de roer

É de se notar que o cinema nacional tem crescido vertiginosamente nos últimos tempos. Há poucos anos, cinema nacional era sinônimo de baixo custo de produção, lucro quase zero e uma qualidade técnica que deixava a desejar frente às grandes produções hollywoodianas. No Brasil, incentivo ao cinema praticamente não existia. Porém, este cenário vem se reestruturando de uma maneira não vista antes ao longo dos anos, com a produção de filmes que atingiram bons números de bilheteria e alcançaram uma qualidade conceitual e técnica significativa, dos filmes independentes aos comerciais. Dois Filhos de Francisco, dirigido por Breno Silveira, talvez tenha sido uma das primeiras surpresas nacionais em termos de indústria cultural. Hoje, o filme da vez é Tropa de Elite, de José Padilha. Um filme que não só atingiu recordes de bilheteria, como talvez tenha sido o mais falado, debatido e pirateado da história do cinema nacional.

Em termos cinematográficos, Tropa de Elite não tem nada de inovador. Não surpreende com efeitos especiais, não possui uma montagem fora do padrão e não inova no tema, já que filmes que falam de morro, polícia e traficantes no Rio de Janeiro são o que há de mais clichê no Brasil. Dessa maneira, onde é que reside o mérito de um filme de tão estrondoso sucesso? Exatamente nessas mesmas características já citadas. Tropa de Elite tem tudo aquilo que se é esperado de um filme, não traz surpresas e muito menos questionamentos: é uma produção que se baseia na violência em seu estado puro, e não mais do que isso, para contar uma história que possui uma densidade e uma complexidade que vão muito além da simples descarga imagética de cenas chocantes e violentas. Um dos maiores erros cinematográficos é “falar da violência utilizando a violência”. Talvez o filme pudesse ter alcançado o status de obra artística caso trabalhasse o tema utilizando uma outra linguagem, que não a própria violência.

É o que faz o menos conhecido e de infinita superioridade, Notícias de Uma Guerra Particular. Vendido como Tropa de Elite 2, o documentário dirigido por João Moreira Salles e Kátia Lund em 1997, foi um dos principais braços de apoio de José Padilha para desenvolver Tropa de Elite. O personagem de Wagner Moura, o “herói” capitão Nascimento, surgiu baseado no capitão Pimentel – o verdadeiro capitão do BOPE (Batalhão de Operações Policiais Especiais) que presta depoimento em Notícias. O documentário, além de discutir o tráfico, a polícia e - o que não faz Tropa de Elite -, dar voz aos moradores do morro que vivem nesse fogo cruzado, consegue discutir tudo isso criticamente e sem usar cenas de violência em nenhum momento. Não há sangue, não há tortura. Partindo apenas de depoimentos, é um filme que consegue chocar ao mesmo tempo em que desenvolve o senso crítico. Sem sangue.

Se existe algo de correspondente entre os dois filmes, excetuando-se o tema e o fato de um ser baseado no outro, certamente não é a maneira como é retratado o embate entre o tráfico e a polícia, mas somente o fato de concordarem que o que se vive nos morros cariocas é um estado de exceção. Segundo Giorgio Agamben, o estado de exceção “não é um direito especial (como o direito de guerra), mas uma suspensão da própria ordem jurídica”, ou seja, ele se configura quando não está em vigor nem o estado de Lei (onde as normas valem) e nem o estado de guerra. O estado de exceção é um “regime da lei no qual a norma vale mas não se aplica, e atos que não possuem o valor de lei adquirem sua força”.

Os dois filmes analisados aqui mostram um panorama desse estado que, cada vez mais, se configura e se fortalece nos morros do Rio de Janeiro. É um estado de guerra instituído dentro de um estado de direito. Sabe-se que lá, o Estado (governos federais, estaduais ou municipais) tanto não entra quanto não tem o menor poder. As leis que estão em nossa Constituição e que nos fazem sentir protegidos de certa maneira, não têm o menor valor dentro desses territórios urbanos. É o que os filmes mostram: um tráfico que impõe suas próprias regras e uma polícia que o faz da mesma maneira, gerando o atual conflito. Tanto os traficantes quanto a polícia e o BOPE suprimem qualquer direito (principalmente humano) e instauram a violência generalizada e a matança indiscriminada, que se tornam a lei do morro.

Em Notícias de uma Guerra Particular, o surgimento do estado de exceção nas favelas é mostrado, mas, diferentemente de Tropa de Elite, ele é criticado como algo que deve ser abolido. O BOPE, por meio do capitão Pimentel, aparece como mais uma parte do problema da guerra do tráfico, e não como uma solução. Já Tropa de Elite surge como um filme legitimador do mesmo estado de exceção. O BOPE e o capitão Nascimento são os símbolos da legitimação desse estado, mostrados não como problema, mas como solução. O combate ao crime necessita do capitão Nascimento. Está aí o ponto crucial que diferencia esses dois filmes, aparentemente tão similares: enquanto um aparece como crítica social, o outro surge como um espetáculo legitimador da violência.

Deslocando a análise para um viés político, ainda segundo Giorgio Agamben, os governos de democracias contemporâneas incorporam “atuações que legitimam a violência, a arbitrariedade e a suspensão dos direitos, em nome da segurança, a serviço da concentração de poder”. Ou seja, os Estados deslocam uma “medida provisória e excepcional (o estado de exceção) para uma técnica de governo”. Tropa de Elite se situa exatamente nesse patamar: um filme que afirma a prática da repressão, em nome da segurança, como solucionadora de uma crise social. O filme acaba sendo uma seqüência de imagens espetaculares, violentas e chocantes, encadeadas de maneira a não despertar nenhuma consciência crítica, e sem aprofundar o contexto denso e complexo que abarca uma situação como a guerra do tráfico.

Em contrapartida, Notícias de Uma Guerra Particular não só apresenta essa complexidade, como aponta negativamente para esse estado de exceção instituído. O depoimento de Hélio Luz, chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro na época da realização do filme, afirma a existência da prática repressiva sem apresentá-la como algo que deva ser aplicado, mas como um dado concreto: “Nós fazemos uma política de repressão em benefício do Estado, em proteção do Estado. Mantemos os excluídos sob controle”.

Em resumo, dois filmes que pertencem à mesma natureza, um servindo de inspiração para o outro, acabam por se distanciar até chegarem a se contradizer, devido ao modo como foram construídos. Tropa de Elite poderia, sim, ser um bom filme que despertasse a consciência crítica do espectador. Mesmo partindo apenas do ponto de vista de um policial, toda sua montagem poderia ser crítica caso não fosse uma ode à violência. Notícias de Uma Guerra Particular, mesmo sendo documentário, prova que isso é possível, sem tom sensacionalista, enquanto que Tropa de Elite prima pela qualidade de imagens violentas. E desnecessárias.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Mergulhando nas águas de Frida

Ela é daqueles tipos que causaram polêmica em sua época. Com uma perna menor do que a outra como consequência de uma poliomelite, e muitos meses de gesso e cama devido a um grave acidente de ônibus, além de uma história de amor por um homem que possuía diversas amantes, mais que pintora, Frida Kahlo é o símbolo de uma luta angustiante pela vida.

Muito além de cores fortes e simbolismos psicológicos, o que se vê em suas obras é a expressão da dor e da tragédia com que a mexicana conviveu ao longo de sua existência. E é exatamente para o mundo inconsciente e subjetivo de Frida que o grupo Teatro das Epifanias, no ano do centenário de nascimento da pintora, abre as portas com o espetáculo Yo soy o que a agua me deu Frida. Dirigida por Wagner Miranda, a montagem reestréia no Centro Cultural São Paulo, dia 6, às 19h.

Com o título retirado de um dos quadros tidos como mais surreais da artista, a performance é resultado de uma pesquisa de quatro anos desenvolvida pela atriz Lilih Curi, que também integra o elenco. Unindo teatro, vídeo, dança, artes plásticas, instalação, música e poesia, a trajetória de Frida é contada em um espetáculo que trabalha, principalmente, a expressão corporal e a elaboração visual. Segundo Lilih, a proposta é “fazer uma interseção entre a poética da artista com outros tipos de linguagem”.

Em meio a projeções de imagens de suas principais obras, coros cantados pelos próprios atores e diversas cadeiras de roda que povoam o cenário, o espectador se defronta com a principal proposta do Epifanias: a experimentação cênica. Comparado às dramaturgias comuns, a presença de texto é quase nula. Isso porque o grupo pretende “narrar pelas imagens e não pelas palavras”, como afirma Lilih. Dessa forma, o trabalho propõe um espetáculo de poesia visual, multimídia, não-linear, em que o público não só navega, como mergulha no universo de Frida.

Centro Cultural São Paulo. De 6 a 16/12. 5ª a sáb, 19h. Dom., 18h. R$15.

Publicado originalmente na Revista Em Cartaz - guia da Secretaria Municipal de Cultura

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Em Cartaz

Já está disponível na internet a oitava edição da revista Em Cartaz, o guia mensal da Secretaria Municipal da Cultura. Ela reúne toda a programação das atividades da Secretaria, desde teatro e cinema até exposições e cursos, passando pela programação de música erudita, música popular, palestras, debates e encontros.

A revista está disponível em formato pdf.
Basta acessar o site da Secretaria:

http://portal.prefeitura.sp.gov.br/secretarias/cultura

sexta-feira, 30 de novembro de 2007

De costas para Hélio Costas

Porque é que deveríamos entrar na onda da TV Digital, com estréia anunciada para o dia 2, se o projeto chega pelo meio do caminho?

* Se você tem televisão de tubo, deverá comprar um conversor para receber o sinal digital, mas não receberá a imagem em alta definição.

* Se você tem televisão de plasma ou LCD, poderá receber as imagens em alta definição, mas somente com o auxílio do conversor. Mesmo assim, apenas aparelhos compatíveis com o HDTV receberão esse conteúdo.

* Os conversores para televisões de tubo, LCD ou plasma são vendidos por mais de R$700,0.

* Você poderá acessar a internet pela TV, mas o modelo do negócio ainda não está disponível.

* Você também poderá receber sinais da TV Digital em seu celular. Mas, mais uma vez, esse tipo de aparelho ainda não está disponível no mercado.

* Nem todos os canais vão disponibilizar o sinal digital de imediato, somente a Globo, Record, Gazeta e Bandeirantes.

* Nem toda a programação vai ser transmitida em alta definição. A emissora irá escolher programas específicos.

* Para que a TV Digital funcione perfeitamente, é preciso ter o televisor “pronto para a TV Digital”, ou seja, com receptor interno e HDTV. O problema é que ele ainda não está à venda no mercado.

* Isso tudo só para TV aberta. Os adeptos da TV a cabo vão ter que esperar sua vez.

Para mim, isso tudo é uma grande piada contada por Hélio Costa.

Fonte: IDG Now

segunda-feira, 26 de novembro de 2007

O cara mais legal do mundo

Tom Zé é o cara mais legal do mundo. Não há dúvidas.


Foto: Luísa Bittencourt

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

O embrião do sxe?

Estava aqui lendo alguns textos sobre Frank Zappa e me deparei com a seguinte frase do falecido:

Droga não é o mal. A droga é um composto químico. O problema começa quando pessoas tomam drogas como se fosse uma licença para poderem agir como babacas.

Aplausos!

Clássicos

Assim como não sou filiada a nenhum partido, também não falo em nome de nenhum. Acho a filiação partidária muito complicada, mas esse é um outro assunto. O que quero trazer aqui é que o site Vermelho, apesar de ser do PC do B, além de trazer artigos e matérias muito interessantes e bem colocadas politicamente, tem um espaço em que disponibiliza clássicos da literatura política de Marx, Engels e Lênin na íntegra para qualquer pessoa fazer download. Entre elas, obras como "Manifesto do Partido Comunista", de Marx e Engels e "Estado e Revolução", de Lênin.

O site é http://www.vermelho.org.br/ e os livros estão disponíveis na seção Marxismo + Brasil

sexta-feira, 9 de novembro de 2007

Contagem...

A PUC ESTÁ SEM INVASÃO DA PM HÁ:

30 anos

1 mês

18 dias

http://ocupapuc.wordpress.com

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

A ocupação continua

Ontem, em assembléia realizada em frente ao Tuca com a participação de cerca de 700 estudantes, ficou decidido que a ocupação na PUC-SP continua.

Seguem duas fotos de ontem:




Continue acompanhando pelo blog da ocupação:
http://ocupapuc.wordpress.com

terça-feira, 6 de novembro de 2007

Papagaios de Capitão Nascimento

Na noite de ontem, a reitoria da PUC-SP foi ocupada pelos estudantes após uma assembléia para discutir o Redesenho Institucional da Universidade. Discussões sobre o mérito da ocupação, se é correta ou não, deixo para um outro momento. A questão que tem me deixado, como estudante da PUC, mais assustada, são as posições reacionárias, conservadoras e fascistas que têm aparecido no fórum de discussão do blog da ocupação (http://ocupapuc.wordpress.com/).

Frases como: "Bando de vagabundos, não estão satisfeitos com o que a faculdade oferece, troquem!", ou "Invasão de propriedade privada é crime" e até mesmo "no nordeste ainda tem vaga para hippie" povoam a discussão e mostram escancaradamente a eterna e nítida divisão entre os estudantes da Universidade. De um lado, os "petistas comunistas sujos de sovaco peludo" e de outro a "elite engomada cabeça de azeitona futuros advogados de nosso país".

Como já disse, não estou aqui para me posicionar pró ou contra a ocupação. A questão é que está se tornando público e explícito que em uma das mais importantes Universidades do país, estão surgindo e proliferando um sem-número de jovens com posições individualistas, mercantis e preconceituosas. Direitistas sempre existirão, mas o que causa espanto é que, pelo menos no meu conceito de Universidade, esse espaço não está mais gerando conhecimento, que seria a sua função primordial, mas sim indivíduos medíocres sem a menor consciência política.

A intenção da PUC é fazer um Redesenho Institucional. Talvez esse redesenho deva ser feito principalmente na formação desses futuros jovens apreciadores de políticas fascistas. Porque, afinal, para se posicionar dessa forma, só podem ser adeptos da pena de morte, da tortura, de traficante morto... Aposto quanto for que pelo menos 90% desses que pregam que os estudantes ocupantes são "comunistas de sovaco peludo", aplaudiram com gosto os feitos do Capitão Nascimento e, quem sabe, desejam até entrar para o BOPE.

Deixo aqui o blog para vocês acompanharem as discussões e poderem se posicionar:

http://ocupapuc.wordpress.com/
E-mail: ocupapuc@gmail.com

quarta-feira, 31 de outubro de 2007

A deixa de Maluf...

Fim de tarde, faço um sanduíche antes de ir para a faculdade e ligo a televisão para ver o que está se passando lá fora:

Datena, o queridíssimo dos conservadores de plantão, conversa com o capitão da ROTA enquanto passam imagens de viaturas cortando o trânsito, com a seguinte legenda: POLÍCIA NA RUA, BANDIDO NA CADEIA. Então, Datena parabeniza o capitão por uma "brilhante operação" (que não me dei ao trabalho de entender qual era) e exalta a ROTA pelo grande compromisso com a sociedade: "ontem mostrei aqui a ROTA ajudando uma senhora a atravessar a rua. Isso mostra o quanto eles estão ao lado da população"...

Desligar a TV antes que, ao lado do capitão, apareça o Maluf fazendo campanha eleitoral.

sexta-feira, 26 de outubro de 2007

Abaixo a Ditadura do Genital!

Transexuais lutam para deixarem de ser prisioneiros do próprio corpo e vítimas da estigmatização

Bárbara Graner é loira, alta e veste um vestido estampado. Tem olhos claríssimos e um sorriso que brota com a maior naturalidade. Na cabeça, óculos de armação grossa e branca nos conduzem imediatamente à imagem das heroínas dos anos 60, feministas que lutaram pelos direitos da mulher. Bárbara se considera uma feminista e, além de tudo, luta por outras bandeiras. Hoje, seu maior desejo é ser reconhecida como mulher, mas diferente “daquele arquétipo feminino da Amélia dos anos 60”, explica a transexual, que – contrariando as crenças do senso comum – não é profissional do sexo, mas sim educadora. “Hoje participo de projetos voltados à formação técnica de profissionais da educação para que eles possam multiplicar o conhecimento acerca da identidade de gêneros e da transexualidade, inclusive no âmbito escolar”, conta ela, que começou sua carreira profissional como agente de saúde comunitária tratando DSTs.

Sem rótulos - A vontade de “se transformar” - no jargão trans – sempre existiu: “Eu me lembro que aos 5, 6 anos, imaginava que uma fada-madrinha fazia ‘plim’ e o meu órgão se transformava. Aos 14, ganhei o livro Conversando Sobre Sexo, da Marta Suplicy. Quando li a definição de transexual, tive duas alegrias ao mesmo tempo: descobri que a cirurgia já existia e que eu não era única no mundo.” E, de fato, não era.

Ela, assim como muitas outras, é vítima do preconceito, que continua pautando o senso comum, pois a transexualidade – e não o transexualismo, pois o prefixo –ismo é associado à patologia, explica o antropólogo Jorge Leite Jr. – é freqüentemente confundida com homossexualidade ou travestilidade. Bárbara, porém, não tem dúvida: “Eu sou mulher, gosto de chocolate, de cinema, sou ativista de movimentos sociais e, dentre todas essas características, sou transexual.” Ou seja: sua identidade de gênero é feminina, e ela nasceu “com alguma coisa a mais”. Rafaelly Domingues, 21 anos, que também é trans, esclarece que “transexual não significa não possuir mais o seu órgão sexual de nascimento, mas ter a mentalidade de mulher”.

Biopoder - Jorge Leite Jr., antropólogo que começou a participar de reuniões da Associação da Parada Gay após concluir sua tese de mestrado sobre travestis e pornografia, também está intrigado com a discussão da identidade de gênero: “Baseado em quê podemos dizer se a pessoa é homem ou mulher? A roupa, o corte de cabelo e todo um arcabouço cultural é que vão definindo esses papéis. A nossa cultura ocidental é que criou o conceito de dois sexos opostos.”
Essa visão oclusa e maniqueísta da sociedade faz com que muitos transexuais tenham seu direito à cidadania constantemente violado. Para conseguir alterar sua documentação, por exemplo, dependem de uma jurisprudência ou, em última instância, da “boa vontade do juiz”, opina Graner. “Não temos nenhuma lei que garanta essa alteração de nome [após a cirurgia]. O que nós temos hoje são algumas transexuais que conseguiram mudar sua documentação com um bom advogado e um juiz que teve uma avaliação pessoal favorável”.

A ilusão de autonomia sobre o próprio corpo configura o fenômeno denominado por Foucault de “biopoder”, que diz respeito ao desejo do Estado em manter o indivíduo saudável, estável e sob controle como forma de reafirmar e ampliar sua própria autoridade. “Na nossa cultura, o Estado diz que você não pode usar droga, não pode se suicidar e, se for mulher brasileira, não pode abortar”, explica Jorge, que acredita que a submissão aos “homens de branco” para conseguir mudar de sexo é mais um exemplo da noção de biopoder.

A Cirurgia – No dia primeiro de dezembro de 1952, Nova Iorque foi sacudida pela notícia de que George William Jorgensen, Jr. – estudante da Universidade de Colúmbia e soldado do Exército, a partir de 45 - havia se transformado em Christine Jorgensen. O nome foi escolhido em homenagem ao seu cirurgião, o dinamarquês responsável pela realização da primeira cirurgia de redesignação sexual (CRS - Sex reassignment surgery – SRS, em inglês), Dr. Christian Hamburger. Em 1953, quando retornou à Nova Iorque, sua cidade de origem, Christine já era uma celebridade.

A primeira operação feita no Brasil foi realizada pelo médico Roberto Medina em 1971. Naquela época, em que os padrões morais eram ainda mais retrógrados e a transexualidade era um tabu, a prática foi tida como criminosa, o que culminou em um processo contra o médico, que foi acusado de mutilação. Assim, a cirurgia de transgenitalização (como também pode ser chamada), assim como as pesquisas nessa área, ficaram sendo proibidas até o ano de 1997, quando Roberto Medina entrou com recurso na justiça e venceu, conseguindo com que a prática da operação fosse legalizada no país, mas apenas em hospitais universitários e em caráter experimental. Em 2002, devido ao êxito alcançado, as cirurgias de transgenitalização do sexo masculino para o feminino (MtF) deixaram de ser consideradas experimentais, enquanto que as do sexo feminino para o masculino (FtM) ainda se encontram em caráter experimental.

Hoje, para realizar a operação, é necessário passar por uma vasta avaliação e por um acompanhamento médico que, dentre outras coisas, respeitem as normas estabelecidas pelo Conselho Federal de Medicina. Os médicos baseiam-se em um formulário-padrão organizado pela Associação de Disforia de Gênero Harry Benjamin, que define que há seis níveis de transexualidade, e “as variações vão desde o simples prazer de se vestir como mulher, até a pessoa que tem total repulsa com relação ao seu órgão sexual”, explica Jorge. E, para a realização da operação, é necessário que o paciente esteja enquadrado, impreterivelmente, do quinto para o sexto nível. Porém, Bárbara, que esteve na fila do Hospital das Clínicas para a realização da cirurgia de 1993 a 1999, mesmo ainda com o desejo de realizar a operação, decidiu não fazê-la, após questionar o preparo dos profissionais que iriam realizá-la: “Nós estamos diante de uma máfia de branco. Eu não tenho poder de participar de uma decisão que vai afetar a minha vida, meu organismo. Como você vai utilizar uma equação matemática para definir a sexualidade de uma pessoa?”. E ainda completa: “Há diferenças entre as transexuais, assim como há diferença entre duas mulheres, mas isso não significa que uma seja menos mulher do que a outra”. Segundo ela, além de não participarem de nenhum preparo psicológico para tratar do assunto, os médicos são mal informados quanto à situação das transexuais e, ainda por cima, tratam do assunto como algo estritamente pragmático, o que é um problema quando estamos lidando com seres humanos: “Nós temos subjetividade”. Jorge comenta que, inclusive, já houve casos de uma transexual não conseguir realizar a operação pelo fato de andar de moto.

A utilização deste formulário-padrão acaba se tornando um problema na medida em que, com a necessidade de rotular subjetividades, acaba por fazer com que as próprias transexuais tentem manipular os médicos para atingir sua meta. “Espera-se que a pessoa diga que sempre quis mudar de sexo, que sinta nojo com relação ao seu sexo”, explica Jorge. “A gente às vezes é obrigada a usar esse tipo de discurso para conseguir a cirurgia”, confirma Bárbara. Jorge confirma: “já que os médicos têm tanto poder sobre elas, elas falam o que eles querem ouvir”.

Teoricamente, os médicos acompanham as pacientes por dois anos, tempo em que julgam suficiente para analisar as questões exigidas pelo formulário e, segundo o antropólogo, “isso é superestimar a capacidade dos médicos e de subestimar a determinação dos transexuais”.

Passo a passo - Além do preparo psicológico e hormonal ao qual é submetido o paciente, a cirurgia de redesignação sexual, que para ser realizada deve ser aprovada pelo Conselho Federal de Medicina, é um tanto quanto complicada e só pode ser praticada em maiores de 21 anos e até os 65 anos de idade, em média.

No caso da cirurgia Male to Female (MtF), o processo consiste na retirada do pênis e do saco escrotal e na criação do túnel perineal, que futuramente abrigará a vagina. A partir do saco escrotal são construídos os lábios vaginais. A pele do pênis é utilizada para o revestimento do túnel perineal e o clitóris é reconstruído com parte da uretra que tem alguma sensibilidade, o que possibilita que a pessoa operada sinta orgasmos em suas futuras relações sexuais. Essas relações só poderão ocorrer, em média, dois meses após a cirurgia e sempre com o uso de lubrificantes, pois a neovagina não é capaz de produzir lubrificação natural. O fato de passar pela operação de transgenitalização não significa que a pessoa passará a produzir hormônios femininos. Mesmo após a cirurgia, é necessário que o paciente continue tomando hormônios femininos, que influem, entre outras coisas, na mudança da voz.

Já o caso da cirurgia FtM é mais complicado. Há a reconstrução do órgão sexual, denominado neofalo, com o auxílio de implementação de uma prótese, além de remoção dos seios e, em alguns casos, lipoaspiração. Porém, este tipo de operação ainda não é considerada totalmente satisfatória, na medida em que há muitos problemas de ereção e também na qualidade estética.

Apesar de cada vez mais estar aumentando a prática dessas cirurgias, elas ainda têm suas contra-indicações, e Rafaelly, que ainda não passou pela operação, deixa o alerta: “Cortar um órgão sexual é como cortar um dedo: irreversível. Por isso deve-se pensar muito antes de realizá-la”.

Filhas da Noite - A falta de oportunidades na sociedade faz com que travestis, em sua maioria, tenham que se prostituir para sobreviver e conseguir realizar, caso desejarem, a cirurgia de transgenitalização. “Por causa do preconceito, o mercado de trabalho é restrito e ainda tem travesti que fica com vergonha de sair na rua. A prostituição é a forma mais fácil de uma travesti conseguir fazer o corpo”, explica Rafaelly. “Aqui no Brasil, as travestis estão fortemente ligadas à marginalidade e à prostituição”, diagnostica Jorge.

Para debater questões em torno da identidade de gênero das transexuais e travestis, além de pleitear a criação de políticas públicas que viabilizem a inclusão desses segmentos na sociedade, foi criado o Fórum Paulista de TT (travestis e transexuais) que começa a incorporar os transgêneros. “O fórum surgiu a partir de demandas e o segmento, que incluiu representações de outros Estados, se tornou protagonista”, afirma Kika Medina, diretora . “São Paulo é a maior cidade da América Latina e ainda não temos políticas para travestis e transexuais”, afirma Fernanda de Moraes, organizadora do SETRANS (Seminário Paulistano de Debates para Transexuais e Travestis). O Deputado Federal Paulo Teixeira, é um dos comprometidos com a causa do movimento. Em seu site (www.pauloteixiera13.com.br), ele promete analisar alternativas que tratem com dignidade transexuais e travestis, facilitando a mudança do prenome e possibilitando a carteira com o nome social, uma das principais reivindicações das transexuais.

A importância do documento feminino

O depoimento da irmã de uma transexual que não deseja se identificar e que sentiu diariamente as dificuldades vividas por ela

"Depois de transformada, mesmo antes da cirurgia, o que mais limitava minha irmã era a documentação masculina. Cansei de ir com ela a médicos, dentistas e bancos acompanhadas de algum amigo ou namorado (ultimamente o marido dela), pra que ela não passasse pelo constrangimento total de que alguém a chamasse pelo nome de registro masculino e ter que se levantar pra atender.

Levávamos um homem com a gente, para o caso de que, se chamassem pelo nome masculino, o nosso amigo a acompanhava e quase ninguém percebia. Mais tarde passamos a conversar com os atendentes para que eles chamassem pelo nome feminino que ela usa, mas sempre havia um que esquecia e acabava chamando pelo nome masculino na frente de todo mundo! Que raiva que a gente tinha!

Lembro de um dia em que ela foi fazer um exame e havia uma sala de espera cheia de gente. Como não tínhamos arranjado nenhum amigo para ir junto, pedimos para a atendente chamar pelo nome feminino e ela concordou. Sentamos naquela sala lotada de gente e qual foi a nossa surpresa quando a moça chamou bem alto pelo nome masculino! Eu imediatamente falei baixinho para minha irmã: “Não se mexa. Eu vou lá falar com a atendente!”. Fui lá e falei um monte para a atendente. Minha irmã é tímida, mas eu rodo uma baiana legal!

Se os legisladores pudessem sentir na pele o que passa uma transexual ou um transexual na hora em que tem que atender pelo seu nome de registro, em público, imediatamente criariam uma lei pra não permitir esse constrangimento.

A sentença de mudança de nome e sexo da minha irmã saiu recentemente. Comemoramos com uma festa. Agora ela se sente livre e completa."

Não confunda. Tire sua dúvidas sobre todos os T´s.

Travesti: é uma pessoa que possui sua identidade de gênero oposta ao seu sexo biológico, mas não deseja passar pela cirurgia de redesignação sexual. Os travestis não possuem uma orientação sexual fixa, podem ser homossexuais, heterossexuais, bissexuais e assexuais.

Transexual: é a pessoa que possui sua identidade de gênero oposta ao seu sexo biológico; aquela que nasceu com o órgão sexual masculino mas se identifica como sendo uma mulher ou vice-versa. O que define sua identidade de gênero não é o sexo biológico, mas como a pessoa se percebe. Independentemente do sexo biológico, do papel e da orientação sexual, o que define um transexual é que seu corpo é de um sexo e seu cérebro é de outro. Os transexuais desejam passar pela cirurgia de redesignação sexual, que consiste na transmutação do seu órgão sexual biológico para aquele a qual deseja pertencer.

Drag Queen: é o homem que se fantasia do sexo oposto com o intuito de, na maioria das vezes, fazer performances e shows profissionalmente. Muitas vezes as drag queens podem ser homossexuais, porém sua orientação sexual não é fixa; elas podem ser bissexuais, assexuais e até mesmo heterossexuais. A mulher que se fantasia de homem é chamada de Drag King.

Transgênero: termo aplicado a indivíduos cuja tendência é divergir de seu sexo de nascença (identidade de sexo) e seu papel social. Os transgêneros costumam não se fixar em apenas um sexo, comportando-se ora como homens, ora como mulheres.

Essa matéria foi realizada por Haidi Lambauer e Luísa Bittencourt

sexta-feira, 5 de outubro de 2007

O indivíduo como mercadoria: a produção do capitalismo

Quando a discussão é o capitalismo em sua fase atual, o que talvez venha primeiramente à cabeça é a noção de globalização, multinacionais, oligopólios, entre outros nomes tão freqüentes em nosso cotidiano. Porém, uma das principais características do capitalismo, que é anterior a essas denominações e também o seu verdadeiro sustentáculo é a questão do consumo.

É o consumo o grande norteador da vida pós-moderna. Ele pode ser material, passando pela compra de roupas, comidas, sapatos, móveis e objetos eletrônicos, até chegar no simbólico, que envolve o consumo de imagens, informações, estilos de vida e, até mesmo, de pessoas. Por isso, somos hoje o que há de mais avançado no capitalismo: uma sociedade de consumo.

Mas qual seria a origem desse fenômeno? Com o desenvolvimento do sistema econômico e seu conseqüente crescimento da produção, consumir tornou-se a solução, a palavra de ordem para sustentar essa nova economia.

Quem produz são as empresas, mas quem consome e por quê consomem? Hoje a meta é consumir e quem mais investe pesadamente nisso são os principais interessados: as próprias empresas. Com o objetivo único de vender e cada vez mais obter lucros bilionários, empresas têm investido mais e mais naquilo que é o ponto crucial de seu desenvolvimento: o cliente. Assim, muito mais do que bens de consumo e objetos de primeira necessidade, são vendidos hoje nas prateleiras de todas as lojas conceitos que estão além do material: desejo, satisfação, tranqüilidade e, principalmente, estilos de vida. Como aponta Mike Featherstone em seu texto “Cultura de Consumo e Pós-Modernismo”, as mercadorias passaram do simples valor de troca ao valor simbólico, que pode trazer ao consumidor status, posição cultural e definir seu pertencimento a um grupo. Marx chamaria esse fenômeno inicial de “fetiche da mercadoria”, em que a mercadoria assume outro valor além do seu próprio de necessidade primeira: o de fetiche.Uma mercadoria envolta de signos e símbolos que se torna um fetiche.

Dessa maneira, assistimos hoje a um fenômeno inédito: aquilo que o ser humano não consegue encontrar em sua vida real, ele busca no consumo. Ou seja, é comum vermos, por exemplo, ocorrer que quando alguém se sente extremamente triste ou angustiado, vai diretamente ao shopping gastar, comprar coisas de que não precisa, comer comidas que não deseja e, ao sair de lá, se sentir muito mais aliviado. Em um episódio como esse, é nítido que o que o sujeito estava à procura não era daquilo que ele realmente necessitava, mas sim, de uma fuga, de suprir o desejo de simplesmente TER algo.

Os jornais na televisão, principalmente em época de datas festivas, chegam a ser abusivos na questão do consumo. Deixando de lado a questão de que datas comemorativas em que há troca de presentes foram criadas pelo capitalismo, a masturbação mental de que se deve comprar, comprar e comprar chega ao ponto de se tornar lavagem cerebral. No Jornal Nacional, por exemplo, os repórteres vão sorridentes aos shoppings mostrar como “é bonito” uma multidão de gente se estapeando para conseguir entrar em uma loja, os preços “incríveis e imperdíveis” dos produtos e exaltam o consumidor como o grande herói do momento: “esta senhora gastou R$100,00 em compras e está saindo com o carrinho cheio!”.

Muito mais do que uma prática comum de suprir necessidades, consumir indefinidamente não só é visto como algo normal, como é pesadamente incentivado, exaltado e almejado.

Acontece que esse prazer do consumidor é momentâneo. Aquilo que se compra hoje já não tem mais o mesmo valor e importância amanhã e outras “necessidades” de consumo vão surgindo incessantemente. Seu carro de hoje já não é mais tão moderno quanto ontem, a roupa já estará fora de moda daqui alguns meses e até mesmo os estilos de vida são efêmeros como, por exemplo, os lugares que você freqüenta hoje já não mais serão os mesmos que você irá daqui uns poucos anos, ou até mesmo dias. Isso tudo porque a fuga da realidade em consumir não resolve aquilo que está errado na própria realidade, mas cria uma ilusão que não será nunca alcançada e satisfeita. Assim, as pessoas vivem hoje em uma busca contínua de satisfação de uma “necessidade” por meio do consumo que, quando satisfeita, irá dar lugar a outra “necessidade” e assim indefinidamente. Hoje, consumir se esvazia em si mesmo: só tem o sentido de simplesmente consumir.

O problema mais grave aparece quando essa necessidade de consumir ultrapassa os limites do objeto material. Quando além de roupas e objetos eletrônicos, por exemplo, passamos a consumir as próprias pessoas. Nunca se viu uma quantidade tão grande de relacionamentos e até mesmo casamentos que duram poucos meses e, enquanto duraram, pareceram extremamente intensos. Namoros duram até semanas e, na Alemanha, já há inclusive a proposta de um projeto de lei que anule automaticamente todos os casamentos após passados sete anos, já que o índice de divórcio é muito maior do que o número de casamentos que se mantém. Mas porque será que isso acontece? Entre tantos problemas cotidianos da vida moderna, como ter filhos, levá-los para a escola e ao mesmo tempo cuidar da casa, do marido e dos amigos, é até compreensível que um relacionamento se desgaste rapidamente, coisa que não acontecia em tempos passados. Acontece que, muito mais do que relacionamentos desgastados naturalmente, o que está ocorrendo é uma verdadeira transformação das próprias pessoas em objetos de consumo. Ou seja, compramos o nosso parceiro: estabelecemos um perfil que desejamos com determinadas qualidades e características físicas, saímos à procura de alguém para namorar (porque hoje ficar sozinho é algo difícil de se querer) em bares, baladas, restaurantes… A vontade de consumir alguém e suprir carências afetivas e solidão é tão grande que há, inclusive, aqueles que ficam com mais de uma pessoa por semana e até mesmo em um dia conseguem sair de uma festa com cinco números de telefones diferentes e amassos a mais para anotar na agenda.

Mas, para ir além, depois de uma busca frenética por alguém, esse alguém depois de encontrado é consumido até não se tirar mais nada do sujeito. Ou seja, se estabelece um relacionamento, em que no início tudo é amores e flores, para em questão de poucos meses tudo já estar desgastado e acabado, o parceiro totalmente sugado, totalmente consumido. Aí se dá o momento de renovar: jogar fora e partir para outra. Exatamente como são tratados objetos materiais: compra-se uma TV nova hoje e amanhã, quando aparecer outra com mais funções e novidades, joga-se a antiga fora e consome-se a nova até que apareça outra e assim indefinidamente.

E isso não ocorre somente no nível dos relacionamentos amorosos. No âmbito das amizades e de parceiros profissionais também. Algumas amizades são estabelecidas porque essa ligação acaba por ser positiva para uma das partes, ou para as duas, por um certo tempo, até que quando não houver mais o que tirar de proveitoso dessa amizade, ela acaba. No mundo do consumo, tudo se tornou mercadoria, inclusive o ser humano.

Fontes consultadas:

BAUMAN, Zygmunt. Vida Líquida. Jorge Zahar Editor, Rio de Janeiro.
DEBORD, Guy; A sociedade do espetáculo. Contraponto
FEATHERSTONE, Mike; Cultura de Consumo e Pós-Modernismo. Studio Nobel

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

Em romance: o feminino atemporal

O lançamento foi em 1973 mas poderia ser uma das últimas publicações de qualquer editora brasileira. As Meninas, de Lygia Fagundes Telles, é daqueles romances que, de uma maneira ou de outra, encontram seu lugar no espaço e no tempo, independentemente de quais sejam: mexeu com a juventude dos anos 70 e ainda tem o poder de fisgar leitores contemporâneos, devido a sua atualidade.

O momento histórico pelo qual passava o Brasil: a década de 60. A história é sobre três meninas universitárias que vivem no pensionato Nossa Senhora de Fátima, em São Paulo, absorvendo os acontecimentos da época em seus cotidianos. Lorena Vaz Leme, Lia de Melo Schultz e Ana Clara Conceição são as responsáveis por conduzir um enredo que vai desde banais conversas entre elas até idas a festas e projetos de fuga, contados sob a ótica de cada uma das personagens, diferentes em origem, posição social e personalidade, mas amigas.

Lorena é a delicadeza em pessoa. Vive dentro de seu quarto com discos, chás e divagações acerca da vida e do amor misterioso, chamado por ela de M.N. Lia, mais conhecida por Lião, é uma estudante de Ciências Sociais que vive às voltas com manifestações, livros, debates, ações políticas e com a preparação para a revolução, que cedo ou tarde virá. Ana Clara é uma linda modelo que se perde em sua beleza e se encontra em drogas e mentiras.

Drogas e mentiras. Masturbação, plástica, casamento e relações homossexuais. Assuntos muito atuais, mas que Lygia Fagundes Telles teve peito de abordar em plena década de setenta, época em que o Brasil passava por uma das piores fases da ditadura militar, com perseguições, prisões, exílios e mortes. Aí está a genialidade da escritora, que se desvenda no ato de trazer sutilmente à tona temas de certa polêmica sem que causem desconforto mas que também não passem despercebidos.

Mas talvez o que há de mais revolucionário no livro, e que também acaba por causar, inicialmente, um certo estranhamento ao leitor acostumado com narrativas lineares de um só narrador, é exatamente a ausência de cronologia fixa e a inovação na forma de narrar. As Meninas é um romance psicológico em que a narrativa segue o modelo do fluxo de consciência, tendo poucos fatos concretos. A partir da alternância dos pensamentos de cada uma das três meninas, as verdadeiras narradoras, a história vai se apresentando sempre de uma perspectiva diferente. Quando o foco está na consciência de Lorena, a linguagem é mais pausada, fantasiosa e poética. Já quando Lia está em cena, o texto se transforma em algo mais racional, lógico, pé no chão. Os momentos de divagação de Ana Clara talvez sejam os mais difíceis de se compreender, já que, como se trata dos pensamentos de alguém sob o efeito de drogas, o texto aparece confuso, com frases sem fim, ausência de pontuação, palavras repetidas e a interpenetração de temas que parecem não ter sentido nenhum. Tudo de acordo com a personalidade de cada uma delas.

Uma bela, elegante e talentosa representante da mulher na literatura, muitas vezes comparada a Clarice Lispector pelo trabalho com o romance psicológico e o universo feminino, Lygia soube traçar no livro as linhas que delineiam a visão da interioridade feminina. As personagens, ricas e complexas, passam por situações como o amor, a angústia em relação ao sexo, a preocupação com o corpo e todo o tipo de questionamentos acerca da vida de uma mulher, nesse caso, jovens. Lygia deixa, literalmente, a alma de cada uma dessas meninas falar.

Lygia teve nessa publicação uma de suas maiores glórias, recebendo os prêmios Coelho Neto, da Academia Brasileira de Letras, o Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro, e o de "Ficção", da Associação Paulista de Críticos de Arte. Anos depois, em 1996, o livro ganhou espaço no cinema com o mesmo nome: As Meninas.

Quase 40 anos depois, a atualidade do livro se mantém. Não somente nos temas que foram tabus em certo momento e causam discussões até hoje, mas também no fato de que a interioridade feminina é atual sempre, por nunca ter sido desvendada. Qualquer garota que tenha esse livro em mãos - e aceite o desafio de lê-lo - irá encontrar elementos, sejam eles quais forem, em diferentes quantidades com os quais irá se identificar. Qualquer uma irá sentir um pouco de si mesma em algum momento, em alguma frase, em algum pensamento. Lírica como Lorena, revolucionária como Lia ou confusa como Ana Clara, há sempre alguma delas em uma mulher.

terça-feira, 11 de setembro de 2007

Horário de Brasília

Quando decidi que iria para Brasília acompanhar dois shows das bandas Busscops e Nerds Attack, ambas de São Paulo, ainda pairava uma certa dúvida na minha cabeça: mas o que é que existe em Brasília além do poder de nosso país? Eu já havia visitado a capital em 2003, porém foi uma viagem de campo, em que não fui em nenhum lugar além de 1km da Esplanada dos Ministérios. Dessa vez, não só conheci rapidamente outros lugares que não o famoso avião de Niemeyer e Lucio Costa, como também pessoas e atividades de lá que nada tem a ver com o pessoal do Congresso Nacional e arredores.

Seca, de um verde queimado, quente, plana. Brasília é assim. E é também o berço de importantes bandas de rock, como Legião Urbana, Capital Inicial, Plebe Rude e Raimundos. Mas elas ou acabaram ou andam criando coisas estranhas por aí. O que está acontecendo na cena rock de Brasília hoje?

Utgard Trolls

Bandas independentes é o que não faltam. De hardcore, punk ou trash, elas existem aos montes e vão cada vez mais surgindo novas. Em nossa rápida passagem por lá (dois dias de shows) conhecemos lugares e pessoas que mantêm a cena alternativa de pé com muita dedicação. É o caso de Totórs, vocalista do Innocent Kids, que além de organizar diversos shows e abrigar paulistas em sua casa, também cuida de uma distro.

O show organizado por ele no Galpãozinho Gama, na cidade satélite de Gama, teve oito bandas, sendo seis de Brasília. Foram elas: Massacre Bestial, Low Life, Innocent Kids, Utgard Trolls, Orgy Of Flies e Terror Revolucionário. Pessoalmente, dou destaque ao Utgard Trolls, punk pesado, tendo uma mulher na linha de frente com um dos vocais femininos mais fortes que já vi: rouco e agressivo. O Terror Revolucionário também merece atenção, já que além de ter mais de 10 anos de banda, faz um som rápido de conteúdo contestador. A curiosidade é que o Barbosa, guitarrista da banda, serviu seis anos na Aeronáutica.

Há duas horas de Brasília, em Goiânia, o segundo e último show, no Capim Pub. Uma casa (literalmente uma casa, que tem inclusive poço nos fundos) pequena, com espaço para os shows que chega a ser menor que muitos estúdios e que, mesmo assim, não impediu que fossem os shows mais nervosos e animados, com muitos punks na roda, pogando e cantando. O esquema toda improvisado, como o balcão do bar feito de tijolos e tábuas empilhados, reflete a vontade de sempre querer manter um espaço para a música alternativa, mesmo que de maneira precária. E mesmo assim, o lugar encheu.

Talvez essa tenha sido uma lição de que não podemos nunca julgar um lugar por aquilo que nos transmitem na televisão. Assim como o Rio de Janeiro não é somente favelas e traficantes, Brasília não é apenas Palácio do Planalto e engravatados. Existe população com voz ativa, que produz fanzines, cria bandas e organiza shows. Uma voz que sabe atacar o poder.

quinta-feira, 23 de agosto de 2007

A Todo Anarquista

Dizem que Deus, após criar o mundo em seis dias, no sétimo descansou. Era domingo. Assim sendo, esse dia tornou-se sinônimo de dia de descanso em todo o mundo. Mas, diferentemente do que está escrito na Bíblia, o Centro de Cultura Social faz de todos os domingos dias de grandes reflexões e ativismo na programação Cinema e Anarquia – Imagens da Subversão & A Subversão da Imagem.

Ao exibirem, sempre no período da tarde, filmes marginais, anarquistas e que suscitam discussão, para, em seguida, realizar debates, o CCS acaba por se tornar um dos principais núcleos do pensamento e da atividade anarquista que existe hoje em São Paulo. Porém, de novo o centro não tem nada, já que sua fundação data de 14 de janeiro de 1933, momento em que os sindicatos já não eram mais o principal foco de militância anarquista.

Criado como “uma organização pública do movimento anarquista destinada a estudar e debater os problemas sociais”, o CCS foi fechado por três vezes, de acordo com o momento político, até reabrir nos dias de hoje (e que, escusas algumas dificuldades, funciona muito bem), enfraquecendo o discurso de que o anarquismo já não tem mais espaço na atual sociedade. Isso porque, além de realizar as exibições de filmes aos domingos, promove debates aos sábados, possui uma livraria e uma biblioteca repleta de material anarquista (disponíveis para empréstimos), além de um pequeno café.

Neste fim de semana, será exibido “Admirável Mundo Novo”, uma adaptação da obra de Aldous Huxley, às 15h e que, como em toda atividade realizada por lá, tem entrada gratuita. Desligue o Faustão (ou o Domingo Legal) e vá participar.

Centro de Cultura Social
Rua General Jardim, n° 253 – sala 22
Vila Buarque – SP
(próximo ao metrô República)

Apoio: Movimento Anarcopunk de São Paulo – MAP/SP

Acesse:
www.ccssp.org
www.anarcopunk.org

* Dados históricos retirados de Anarquistas: ética e antologia de existências

sexta-feira, 17 de agosto de 2007

Um encontro com o mundo real

Brasileiro. Geógrafo. Professor. Marxista. Intelectual. Negro.
Perguntam-lhe se é difícil a condição de um intelectual negro no Brasil. Ele responde que ser intelectual é uma dificuldade. Ser negro é outra. Ser os dois é um grande problema.
Esse é Milton Santos.

E essa figura acaba de ganhar um dos documentários mais bonitos, fortes e inteligentes que já tive a oportunidade de assistir dentro da produção do cinema nacional. Dirigido por Sílvio Tendler, “Encontro com Milton Santos – O Mundo Global Visto do Lado de Cá”, que teve pré-estréia ontem, desmascara os horrores do mundo atual ao mesmo tempo em que mostra de maneira sutil um pouco do professor por meio dos principais temas que ele trabalhou em sua vida.

Milton era professor da Universidade de São Paulo, desenvolveu uma crítica brilhante acerca da globalização e do território brasileiro, porém morreu sem o devido reconhecimento. Até chegar Sílvio, que trabalhou no documentário por mais de 10 anos e conseguiu reunir em seu filme grande parte da genialidade deste homem.

O que chama a atenção é a maneira como o documentário é construído: imagens de depoimentos de Milton Santos e de entrevistas que concedeu ao diretor do filme desde 1995, são intercaladas com verdadeiras aulas sobre o Brasil e o mundo, que mostram dados do capitalismo selvagem, a fome da especulação financeira, a irracionalidade dos poderosos, a luta de movimentos sociais e de uma humanidade que está nascendo agora. O mundo que é divido entre “os que não comem e os que não dormem. Que não dormem com medo dos que não comem”.*

Narrando o filme, nada mais, nada menos do que Beth Goulart, Fernanda Montenegro, Mateus Nachtergaele, Milton Gonçalves e Osmar Prado. A trilha sonora reúne o melhor da música brasileira, com participação especial de Zélia Duncan e presença de Black Alien&Speed e B-Negão.

Como Sílvio Tendler disse na noite de ontem, em debate após a exibição do filme, enquanto o filme “Os Simpsons” estréia em 500 salas do Brasil inteiro, “Encontro com Milton Santos” estará apenas em seis. Isso só confirma uma das afirmações de Milton Santos, a de que somos colonizados pelos países do norte e que precisamos olhar mais para “o lado de cá”.


*Esta frase aparece em certo momento do filme, porém não consegui transcrevê-la literalmente, coloquei apenas a idéia que consegui guardar na cabeça.

quarta-feira, 8 de agosto de 2007

Não Kassab Nada

Que o Kassab num kassab nada todo mundo já sabe. E que ele discursa por 10 minutos seguidos sem falar nada de interessante, fui provar pessoalmente.

Estive no lançamento da campanha do Dia Mundial Sem Carro, hoje, no espaço Rosa Rosarum, em Pinheiros, com a expectativa de ser um evento que discutisse a fundo o problema do excesso de veículos da cidade e apresentasse e incentivasse alternativas viáveis aos automóveis. Esperei também encontrar um número grande de ciclistas que falariam de suas principais dificuldades. Estava enganada quanto às duas expectativas.

Na última, porque o número de ciclistas era ínfimo perto do número de deputados, vereadores, secretários, assessores, entre tantos outros cargos públicos. Na primeira, porque o que se viu foi um verdadeiro festival de discursos batidos e sem nenhuma novidade, excetuando em especial, o de Eduardo Jorge e de um morador da Cidade Adhemar, que pontuaram as principais causas do trânsito paulista, além de terem apresentado, mesmo que de forma rápida, soluções viáveis.

Porém, todos os outros representantes não falaram mais do que fantasias e discursos irreais. Um sujeito, que não consegui saber exatamente quem era, subiu ao palco para apresentar, por exemplo, a proposta de bloquear para automóveis a Av. Paulista no sentido Consolação-Paraíso. Walter Feldman usou o tempo de sua fala para apresentar um novo projeto da Prefeitura de fazer uma Virada Esportista. “Projeto legal, projeto vai ser assim e nós vamos fazer isso e essas são nossas parcerias...” Ok, mas e o trânsito? E as ciclovias? E os ciclistas? O transporte público? O tema não era o Dia Mundial Sem Carro?

Já nosso queridíssimo prefeito Gilberto Kassab, sendo o último de uma lista excessiva de pessoas a falar, pegou o microfone para hablar sobre nada. Talvez “nada” seja exagero, porque ele falou, mas meia dúzia de abobrinhas do tipo “a prefeitura está fazendo sua parte” e “estamos revolucionando o transporte em São Paulo”. Mas seus principais temas foram o Leve Leite e sua lei de maior orgulho: Cidade Limpa. Seu argumento chegou até a ser engraçado: o paulistano está muito engajado no combate à publicidade ilegal e a Prefeitura recebe, por dia, três mil denúncias de propaganda irregular. E, da mesma maneira, a população vai receber o Dia Mundial Sem Carro com a mesma dedicação. Na minha frente só ficou uma interrogação: ahn?

Tudo isso serviu para eu ver, de pertinho, que as autoridades não estão mesmo nem aí para a questão, só querem falar de seus projetinhos paliativos, puxar o saco um do outro. E, principalmente, que o prefeito não sabe nem o que é que ele tem que falar em um evento como esse.

segunda-feira, 6 de agosto de 2007

A cidade cansada

São Paulo é uma cidade cansada.

Uma cidade prestes a entrar em colapso, uma cidade que se encontra em estado de ebulição. Não só por falta de investimentos em todas as áreas, – saúde, habitação, educação – mas porque, simplesmente, não suporta mais nem um carro em suas ruas.

Isso não é novidade para ninguém. Engarrafamento se tornou sinônimo de São Paulo e todos os termos que envolvem esse “fenômeno” urbano já são tão comuns na vida diária que talvez sejam pronunciados tantas vezes quanto “bom dia”: hora do rush, congestionamento, vias alternativas, trânsito.

O que talvez seja novidade são as ações que andam surgindo por aqui e por ali para tentar acabar, ou ao menos conter o trânsito da cidade. O número de ciclistas é cada vez maior, investimentos em construção de ciclovias tem se tornado medidas necessárias, pessoas que largam seus carros em casa e vão ao trabalho por meio de transporte público – tudo isso são alternativas e soluções (ou tentativas) para dar um fim ao caos.

As organizações que vêm surgindo para construir uma nova mentalidade sobre o meio de transporte em São Paulo também têm cada vez mais se multiplicado. Uma delas é o movimento Nossa São Paulo, que entre outras bandeiras levantadas pela criação e melhoria de políticas públicas da cidade, é uma das principais articulistas do Dia Mundial Sem Carro.

O Dia Mundial Sem Carro acontece todo dia 22 de setembro. A proposta é, nesse dia, fazer com que as pessoas deixem seus carros em casa e, coletivamente, despertar a consciência de toda uma população sobre o transporte. Já que vivemos em uma sociedade onde, além de outras ditaduras, existe a do automóvel, este dia serve para provar que o carro não é estritamente necessário e, principalmente, que há diversas alternativas a ele.

Para dar um pontapé, o dia 8 de agosto (quarta-feira) será uma prévia. Vamos tentar, também neste dia, adiantar o Dia Mundial Sem Carro para, em breve, fazermos dessa prática uma prática cotidiana.

Dica de site:
O blog Apocalipse Motorizado é um dos melhores sites sobre a ditadura do automóvel. Com notícias sobre bicicletadas, especulações imobiliárias e dados em números sobre o “apocalipse”, é um bom meio de se informar sobre o que está acontecendo por aí.

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

Você cansou?

Que bom, porque eu também estou cansada. Estou cansada de ver que a burguesia, quando sente que estão mexendo no seu bolo, apela para a realização de protestinhos de cunho político, mascarado de “direito cívico”. Quando há protestos contra a criminalização dos movimentos sociais, contra a descarada manipulação da grande mídia, a vinda de George W. Bush ou pela melhoria das instituições de ensino público, onde está o senhor Dória? Onde está para apoiar a ocupação da reitoria da USP? Logicamente, ninguém deseja ter um país líder em corrupção, mas quem são os primeiros a sonegar os impostos de suas empresas?

Cansei de ver que em pleno ano de 2007, como afirmou a CUT, o Brasil ainda tem casos de trabalho escravo. Cansei de ver jornalões exaltando as figuras de Antônio Carlos Magalhães e Roberto Marinho, como se fossem grandes figuras que fizeram muito por nosso país. Fizeram muito para os bolsos deles.

Cansei de ver o monopólio da Monsanto, os latifúndios, a exploração da Amazônia. Cansei de ver filhinhos de papai-cabeça-de-vento espancarem empregadas e colocarem fogo em índio e saírem impunes, porque, afinal, “são bons meninos, tiveram educação”. Cansei de ver neonazista matando homossexual, mulher apanhando do marido, cansei de ver casos de estupro. Cansei de ver gente morrendo em fila de hospital, mendigo dormindo embaixo da ponte e morrendo, literalmente, de frio.

Contra todas essas questões, Dória e sua turma organizam protestos na Av. Paulista? Não. Sabe porquê? Porque não interessa, porque eles não são prejudicados por nenhuma dessas questões. Porque enquanto o deles não está na reta, o melhor mesmo é ficar em casa assistindo o Jornal Nacional e pregando que o MST é um movimento de baderneiros e vagabundos. Para mim, o verdadeiro vagabundo é aquele que só pensa em seus próprios interesses e deixa o mundo explodir enquanto isso não o atingir.

Dória, você e sua turma são verdadeiros vagabundos.

E eu cansei de vocês.

quinta-feira, 26 de julho de 2007

A sensação do desconforto

Um mundo frenético, em que o espaço e o tempo são relativos. O que antes parecia longínquo e inalcançável agora suscetível ao toque de nossas mãos. Não sei o nome do meu vizinho e ao menos sei quem ele é, seu rosto pode ser como o de qualquer transeunte das grandes cidades, se confundindo por entre os passantes apressados. Você já parou para pensar na distância que há entre você e o homem que está sentado ao seu lado no ônibus? O individualismo do sistema irracional que não permite o desenvolvimento da percepção em relação ao mundo além do umbigo. Um mundo superficial. A perda dos valores humanos. Passos iguais, movimentos mecânicos, a padronização humana. Quando todos somos produtos, quando todos somos marionetes do fabuloso espetáculo da modernidade, quando tudo o que poderia ser emancipador é englobado pela gulosa ameba das técnicas. É apavorante ter consciência de que fazemos parte de uma auto-destruição. Seria o fim das utopias, seria o fim da história e não há porquê lutar. Esse seria o discurso do malvado monstro que determina nossas vidas, para que sintamos a incapacidade na sua forma mais plena. Discurso forte, discurso lógico. Mas ele se esqueceu de que discursos racionais não têm a força da sensibilidade humana.

* Texto escrito em 2005

sábado, 21 de julho de 2007

Porcos não olham para o céu

Eu, uma pessoa desacostumada com o teatro, diria até mesmo leiga no assunto, venho aqui para opinar sobre uma peça que assisti hoje, no teatro Satyrus. Chama-se “Elevador – porcos não olham para o céu”.

Nenhum cenário. Nem fundo, nem sofá. Nada. Apenas fitas-crepe no chão, marcando um espaço a lá Dogville. E três atores. Que não trocam a roupa – no máximo, tiram ou colocam um casaco. A história: três pessoas presas dentro de um elevador que não pára de subir; um homem com cara e jeito de banana, uma menina de comportamento infantil e um sujeito do tipo escroto e machista. Dentro do elevador é onde tudo acontece.



Creio que, para algo ser classificado como de boa qualidade, deve ter a capacidade de prender e entreter o espectador. É o que acontece em “Elevador”, que enquanto vai se desenrolando, cada vez mais nos traz a sensação de que também estamos dentro daquele espaço de 2x2: claustrofóbica e angustiante.

Enquanto isso, em muitos teatros de grandes nomes espalhados pela cidade, com suas mega-produções e brilhantes celebridades, não presenciamos nem metade do envolvimento que “Elevador” traz. Uma peça simples e de qualidade.

http://www.notivagosburlescos.blogspot.com

Quadrilha de Teatro Notívagos Burlescos apresenta
Elevador – porcos não olham para o céu
Com Luiz Xavier, Guto Nogueira e Sheyla Coelho
Até 04 de agosto – sextas e sábados, 19h – Espaço dos Satyros I
Praça Roosevelt, 214 – Tel: (11) 3285-6345

sexta-feira, 20 de julho de 2007

Novo prato para se deliciar

O mês de julho, apesar de nos ter presenteado com algumas tragédias, trouxe-nos uma boa notícia, em formato de revista impressa: trata-se da nova Brasileiros, de publicação mensal, conteúdo diferenciado e uma equipe criativa e competente.

O que parecia ser mais uma mídia nas bancas, acabou por surpreender em todos os aspectos. Sob a supervisão de Hélio Campos, Nirlando Beirão e Ricardo Kotscho, o time de reportagem e fotógrafos traz tudo aquilo que não se vê por aí: matérias que tratam do brasileiro, o cidadão, da celebridade ao desconhecido pelo público. Os temas são os mesmos dos trabalhados por qualquer revista – o diferencial é o modo como são abordados. Em literatura, Machado de Assis em quadrinhos; no esporte, entrevista com um bicampeão de boliche que está disputando o Pan; na música, o lançamento de uma coletânea de músicas bregas. Preconceito (reportagem de capa), a luta de vale-tudo, um dossiê sobre biocombustíveis e até mesmo mulheres pilotos-militar da FAB, são outros temas encontrados em Brasileiros.

Pessoalmente, a matéria que mais me chamou a atenção foi com o ator global Walmor Chagas, um senhor que faz, na grande maioria das vezes, pequenos papéis em novelas. A reportagem é praticamente poética: textos do próprio ator se intercalam com intervenções do repórter, transformando uma reportagem que poderia ser feita em formato comum, em uma ousadia jornalística.

A revista é grande. Muita leitura se tira dela. Sem esquecer, claro, da parte visual, que nada tem de moderno, mas muito de criatividade. Espero que não seja êxito de primeiro número e que a qualidade se mantenha para os próximos. Está de parabéns.

Revista Brasileiros: www.revistabrasileiros.com.br

sexta-feira, 6 de julho de 2007

Very dangerous

Uma boa que precisa ser registrada:

Tem gente indignada porque os sem-terra invadiram Tucuruí e mexeram com os equipamentos da usina responsável por 8% da energia do país. Pior é o PMDB, que mexe com todo o ministério de Minas e Energia.
Palmério Dória

segunda-feira, 2 de julho de 2007

Festival reúne talentos do samba no Tuca

O Primeiro Festival de Samba Paulista, realizado nos dias 26 e 27 de junho no Tuca, foi um verdadeiro festival de criatividade e talento. Com apresentação de 12 composições vindas de diversas regiões do estado, tivemos a casa lotada, torcidas animadas e representantes do samba paulista por todo canto.

Para concorrer aos prêmios da competição de melhor samba, 263 músicas foram inscritas, das quais 12 foram selecionadas para serem apresentadas no festival. O que se viu foi uma variedade de modalidades de sambas, do samba de roda ao samba canção, do partido alto à bossa nova, do samba breque ao samba sincopado, passando ainda por sambas com toques profundos de jazz.

No primeiro dia, após a apresentação das músicas concorrentes, o público foi brindado com uma taça repleta de nostalgia. Os Trovadores Urbanos cantaram e encantaram a platéia – composta por pessoas de várias idades. Até mesmo os mais jovens fizeram coro para os Trovadores em músicas tradicionais como “Trem das Onze”, “Prova de Carinho” (ambas de Adoniran Barbosa), “Laranja Madura” (Ataulfo Alves), entre outras.

Na segunda e última noite, o clima era de excitação e as torcidas não continham gritos e aplausos para cada música apresentada. Enquanto o júri, composto por Eduardo Gudin, Moisés da Rocha, José Carlos Costa Netto e Zé Luiz Mazziotti decidia a premiação, a presença de Paulo Vanzolini fez o festival chegar ao seu ápice. Músicas como “Ronda” e “Cravo Branco” foram cantadas por sua mulher Ana Bernardo – intérprete de voz rompante –, que ainda pediu a Vanzolini para dar uma palhinha. O compositor não só se emocionou como o fez com todo o público.

Com tantos festivais que são realizados hoje em dia, o Primeiro Festival de Samba Paulista provou que, além de São Paulo ser uma cidade que tem o samba no pé, o samba, diferentemente daquilo que (não) se vê na mídia, está muito mais vivo do que se pensa. Nem morreu, nem renasceu. Continua existindo – e com brilho.

Confira a classificação das músicas no site do Tuca

*Colaborou Heitor Augusto

quinta-feira, 28 de junho de 2007

Para sapatear

Garotas e garotos do mundo,

Para quem não sabe, rola muito evento por aí nos becos undergrounds da cidade e que, para variar, a grande mídia nunca noticia. Pode conferir: é show, festival, mostras e debates que estão sempre acontecendo, tentando se manter de uma forma ou de outra, contando sempre com o apoio de um pessoal fiel que sempre marca presença. Longe de casas de shows espetaculares e bonitos e limpinhos espaços de artes, a “cena alternativa” (não sou muito fã dessa expressão) tem dado muitos e bons frutos.

Todo esse blá blá blá é para convidá-los para o Sapa Fest!, um festival organizado por riot grrrls (minha porca definição de uma linha: “meninas punks e feministas”), que irá reunir cinco bandas de garotas em uma noite só – bandas muito boas, politicamente engajadas e bem colocadas, diga-se de passagem. São elas: Dominatrix (a maior representante brasileira do movimento riot grrrl), dividindo o mesmo repertório com Santa Claus e mais os shows de Bonsai Kittens, Anticorpos e SA44. Enquanto uma banda sai e a outra entra, as Djs Sapas Dragas serão as responsáveis por não deixar a música parar. Mas, apesar do festival ter o público feminino em peso, garotos e homens, irmãos, namorados, primos, pais e avôs também serão bem-vindos, afinal, a mulherada não quer jogar os homens para escanteio, mas tentar fazê-los entender que também temos nosso espaço e que nossa luta é conjunta.



Sapa Fest!
Quando: 8 de julho, às 19h – domingo
Quanto: R$10,00 (antecipados) e R$12,00 (na porta)
Onde: Hangar 110 – Rua Rodolfo Miranda, 110 – Bom Retiro (travessa da Tiradentes)

Conheça as bandas:

segunda-feira, 18 de junho de 2007

Senhorita boa de briga

Professora de boxe tailandês dá o exemplo de atitude e determinação em um espaço onde as mulheres ainda precisam se auto-afirmar

Andressa, ao meio, com suas alunas do Lady's Thai

Por mais que hoje pareça que chegamos ao ápice do nosso desenvolvimento, vivemos em um mundo onde as mulheres ainda são estereotipadas como símbolos da fragilidade e da sensibilidade e onde o masculino ainda impera no que diz respeito, também, à força. Andressa Saboya Prado, 22 anos, é uma dessas figuras que vêm para quebrar esses padrões machistas, difíceis de serem diluídos.

Natural da cidade de Santos, Andressa é professora de uma das artes marciais vistas como das mais violentas no ocidente: o Muay Thai. Conhecida como a “ciência dos oito membros” - por trabalhar com punhos, cotovelos, joelhos e pés – essa luta tem mais de dois mil anos de história. Assim como o futebol é nosso esporte nacional, o Muay Thai, também conhecido como Boxe Tailandês, é o esporte nacional da Tailândia. Conta-se que essa prática foi desenvolvida por camponeses e agricultores para defender a terra e o povo das ameaças de invasões constantes e que, inclusive, questões de política nacional foram decididas em lutas. Diferentemente do que poderia se imaginar, o treinamento sempre foi dado a todos: pobres, ricos, jovens, velhos, soldados e reis. Menos às mulheres. Antigamente era-lhes proibido chegar perto de um ringue, pois, sendo ele um país budista, havia um mito de que a presença delas era uma afronta às forças espirituais que protegiam o palco das disputas. Elas trariam azar aos lutadores e também aos espectadores das lutas.

Depois de muitos anos e avanços, hoje o Muay Thai não é mais restrito aos homens, mas o preconceito ainda reside de algumas formas. A luta feminina é muito nova e hoje, na Tailândia, as mulheres têm o próprio campo de treinamento, onde não se misturam com os homens. Aqui no Brasil, essa mistura existe somente em treinos, não em competições, mas ainda há a visão de que a luta é violenta demais para ser praticada por mulheres. Andressa, que já treinou vôlei, basket, handball e futsal, começou a lutar com 14 anos e diz que quando pisou pela primeira vez na academia para treinar, viu apenas um monte de homens sem camisa, suados, correndo para o aquecimento. “Não existia mulher treinando”, completa. O preconceito que sofreu foi no sentido de subestimarem sua força antes mesmo de senti-la ou de vê-la treinando. Isso a incentivou para que ela continuasse e se tornasse graduada em Boxe Tailandês.

Apaixonada pelo que faz, Andressa lutou muito ao lado de homens, ajudou bastante em treinos e, segundo ela, já ensinou “muito marmanjo por aí”. Então, resolveu montar uma equipe de treinamento para mulheres, o Lady’s Thai. A motivação foi a idéia de poder ensinar outras garotas a fazer a mesma coisa que ela, mas aprendendo com uma mulher, “algo que eu não tive”, explica. No início, a dificuldade era conquistar a confiança de meninas, que hoje são suas alunas, a acreditarem que ela estava ali pra fazer o que gostava e que realmente queria o progresso delas. Com o tempo essa confiança foi conquistada, e hoje Andressa dá aulas tanto em Santos quanto em São Paulo. A procura pelas aulas varia, tendo crianças e mulheres de mais idade com interesse pelo Muay Thai, mas a predominância é de jovens estudantes que encontraram um esporte onde podem ter seu espaço.

A luta para as mulheres não se diferencia praticamente em nada da que é ensinada aos homens. A única diferença se dá na utilização da aparelhagem: apenas na hora do treino com mais contato as garotas colocam um peitoral de proteção. Andressa gostaria de treiná-las para competições, mas é preciso insistir muito nisso, já que o esporte é bem cansativo e exige muita dedicação. “Mas já tive aluna que entrou dizendo que queria que eu a treinasse para subir no ringue”, afirma.

Depois de muitos anos dedicados ao seu aperfeiçoamento pessoal e ao ensino da luta, Andressa diz que hoje as pessoas a respeitam bastante, tanto pela graduação que tem, que não pode ser facilmente conquistada, e por ela realmente ter seu espaço para mostrar o que sabe e ensinar o que pode. Para ela, o crescimento na procura de mulheres pelo treinamento, assim como o respeito que adquiriu no meio, são o reflexo de que as mulheres estão cada vez mais se impondo na sociedade e quebrando tabus. “Estão cada vez mais corajosas”, conclui.

Hoje, o Muay Thai é uma das artes marciais mais usadas em termos de treinamento de segurança e autodefesa e, além de trazer um benefício mental e físico completo, “o poder de autocontrole sobre seu corpo, o crescimento e perceber que, cada vez mais a pessoa fica externa e internamente mais forte” é o que mais fascina a jovem professora. Que dá seu recado final: “Que haja sempre humildade, respeito pela arte marcial e pelo seu professor, não apenas levar como um treino comum e, sim, como um acréscimo interior, ajudando a ser a mulher que deseja”.

Curiosidades:
* Na origem, Muay = arte e Thai = livre ou pertencente à Tailândia.
* A luta chegou ao Brasil por volta dos anos 70, mas somente nas últimas décadas passou a ser mais popular.
* As faixas de graduação são chamadas Kruang e vão do branco (iniciante) ao preto (professor)
* As mulheres devem entrar no ringue pelo meio ou pelas cordas de baixo e não pelas cordas de cima, assim como fazem os homens.
* Na Tailândia, as lutadoras ainda não ganham as mesmas bolsas (em dinheiro) que os homens. Assim, a maioria continua trabalhando em outras atividades ou ainda tendo que conciliar as atividades domésticas com os treinos e lutas.

Lady’s Thai
Mazo Academia
Av. Pedro Lessa, 930 – Santos - SP
Academia Arena Fight Gold Team
Rua Augusta, 775, São Paulo - SP
Comunidade no Orkut:
http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=9450868

segunda-feira, 4 de junho de 2007

É possível mudar o mundo sem tomar o poder

Evento reúne representantes de movimentos sociais para discutir a mídia

Realizada entre os dias 28 de maio e 1° de junho, a Semana de Jornalismo da PUC-SP, evento anual do curso de Jornalismo da Universidade, reuniu professores, alunos e diversos representantes de agências de comunicação, ONG’s e outras entidades durante uma semana, ao longo de todo o dia, para discutir o tema “O Compromisso do Jornalismo na Nova Realidade da América Latina”.

Na quarta-feira, 30 de maio, no período da manhã, o debate “Os meios de comunicação e os movimentos sociais na América Latina” deu um bom panorama de como se comporta, hoje, a grande mídia e de como ela se coloca frente aos movimentos sociais.

Com a mediação do professor Sílvio Mieli, a mesa contou com a presença de João Batista de Oliveira, membro da nacional executiva do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Alejandro Buenrostro, integrante do Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) e Lúcio Flávio de Almeida, professor da PUC-SP. Todos se posicionaram de maneira semelhante quanto ao papel desempenhado pela imprensa, mas com enfoques diferentes: cada um tratando da visão do movimento que estavam representando.

João Batista de Oliveira, como representante do MST, deu início ao debate já com um discurso acalorado e revolucionário. Segundo ele, a grande mídia trata todas as ações do movimento como “invasão”, palavra de cunho ideológico, quando, na verdade, se trata de “ocupação”. Mais de 50% das terras cultiváveis do país estão nas mãos de menos de 1% da população, ou seja, o povo está sendo destituído do seu direito à terra. “nós sabemos quem são os verdadeiros invasores”, afirmou Batista.

O trabalhador do campo sofre todo o tipo de violência, seja moral ou social, e a mídia não cumpre com a sua responsabilidade de divulgar essas dificuldades, como o trabalho escravo ou mortes por péssimas condições de trabalho, principalmente por estafa, mas destina um grande espaço àquilo que é ligado ao capital internacional e às empresas multinacionais. Como, por exemplo, a questão do etanol, agora nas principais pautas da mídia. “O Brasil está sendo vendido e isso a imprensa não noticia”, disse Batista, afirmando em seguida que isso acontece devido ao fato de que as grandes empresas de comunicação se posicionam nitidamente contra os movimentos sociais e, assim, cumprem o papel de descaracterizar e desmoralizar esses movimentos, “tentando aniquilá-los”.

Para ele, as ocupações que o MST realiza, são uma forma de comunicação com a sociedade, pois é nela que esses movimentos se legitimam, não na mídia. Segundo o militante, não se pode contar com o apoio da imprensa, tanto o MST quanto qualquer organização com posição anticapitalista, já que os grandes meios de comunicação exercem “um diálogo ideológico de criminalização dos movimentos sociais”. Sobre a concentração dessas agências noticiosas nas mãos de poucas famílias, fato sintomático do Brasil, Batista afirmou que se trata da expressão da concentração de riquezas no mundo e que essa imprensa impõe a “ditadura da realidade”, ela nos faz “engolir uma realidade que não existe”. E concluiu: “Não esperamos o elogio da mídia, confiamos na nossa capacidade de transformar a sociedade”.

Para dar mais peso ao debate, na seqüência Alejandro Buenrostro, do EZLN, antes mesmo de atacar a imprensa, fez um panorama da situação do México e de como a mídia alternativa e também a ligada aos zapatistas tiveram um papel fundamental na construção política do país. Segundo ele, o México possui uma imprensa “de engano e de simulação”, onde a população não tem voz e “a verdadeira notícia se dá por meio da mídia alternativa”. Os zapatistas, um movimento de insubordinação social indígena de origem maia, para conseguir o apoio da massa e sua legitimidade na sociedade, contou com a ajuda de cartas, comunicados e, principalmente, com a internet e jornais alternativos desenvolvidos pela própria população, como o La Jornada e a revista O Processo. Foi por meio deles que os zapatistas conseguiram tornar visível o movimento de Chiapas, reunir os rebeldes e incitar a população a tomar as armas, ou seja, “criou uma tomada de consciência”.

A preocupação de Alejandro não é em destruir a mídia imperialista, mas sim dar espaço e investir na imprensa alternativa, exercendo uma comunicação ética, verdadeira e coerente. “Vamos dialogar aqui embaixo, onde está o povo! Vamos democratizar embaixo e à esquerda, longe do capital!”, bradou o militante, concluindo com sua frase mais revolucionária da manhã: “é possível mudar o mundo sem tomar o poder”.

Finalizando as falas, o professor Lúcio Flávio, que se desculpou por não ter algo empírico a contar, elaborou um discurso um pouco mais teórico e bastante carregado de conceitos marxistas. “Os movimentos sociais são expressões da luta de classes”, iniciou. E emendou: “nunca teve tanto capitalismo no mundo e com ele se expande o processo de proletarização que se planetariza”. A partir disso, desenvolveu uma crítica às comunicações e ao sistema capitalista baseada no fato de que essa massa proletarizada não está nas fábricas, mas é composta por desempregados e que, muitas vezes, se encontram em condições de miséria. Isso faz com que ou aceitem sua própria condição e continuem vivendo miseravelmente, ou se rearticulem em movimentos sociais. “Os movimentos sociais são ricos porque oferecem novas perspectivas de democracia”, afirmou. Segundo o professor, vivemos em uma democracia burguesa baseada na mercantilização das relações e isso se reflete também na mídia.

Partindo para o âmbito das comunicações, a título de exemplo, Lúcio Flávio se utilizou do mais representativo veículo da grande mídia que temos hoje no Brasil: a revista Veja. A cada página folheada mostrada aos presentes, o professor foi desenvolvendo seu argumento de que a comunicação se detém estritamente no processo de consumo, ignorando o processo de produção. De folha em folha, um mundo bonito e limpo é apresentado, seja nas matérias ou seja no excesso de propaganda de beleza e carros. E quando os movimentos sociais conquistam o mínimo de espaço nesse tipo de mídia, ele é mostrado como sujo, “como um movimento de ratos”. Segundo Lúcio, o leitor é interpelado como consumidor e a mídia dominante, além de não informar, não possui nenhum projeto para o país, diferentemente do que acontece com muitas publicações alternativas de movimentos sociais. Finalizando a mesa do dia, o professor retomou a questão do uso das palavras “invasão” e “ocupação” antes discutida por João Batista: expôs que não se trata somente de uma luta semântica, mas político-ideológica, entre aquele que crê em um mundo melhor e o que crê no capital.

Não fosse o tempo restrito que havia para a atividade e o cansaço já aparente dos presentes, que estavam por lá há quase três horas, as palestras poderiam durar o dia inteiro, gerando as mais acaloradas discussões e propostas para o futuro da imprensa no Brasil e no mundo. Porém, a mesa teve seu fim, mas deixou uma semente de indignação naqueles que pretendem mudar o mundo - sem que seja preciso tomar o poder.

terça-feira, 22 de maio de 2007

Meu país é o mundo inteiro

Clássico de Virginia Woolf é uma das maiores expressões do feminismo na literatura

Se tivemos um século XIX em que a mulher estava consagrada à função de reprodutora, o século seguinte é considerado o triunfo do sexo feminino. Uma época de revolta das mulheres, contra a dominação masculina, contra a idéia arraigada de que as mulheres são anjos a serviço das necessidades e do conforto dos homens. Tempo que deu, enfim, nascimento a mulheres escritoras, romancistas, poetas, críticas de arte e pesquisadoras. Com este pano de fundo que se insere a escritora Virginia Woolf, uma das mais importantes e sensíveis precurssoras do feminismo.

“Como mulher, não tenho país. Meu país, como mulher, é o mundo inteiro”, disse certa vez a escritora inglesa, que imprimiu sua marca de luta feminista de diversas formas no mundo da literatura. Desde publicações de resenhas em jornais até seus grandes romances, Virginia Woolf sempre cultivou um espaço para expressar sua discordância com o mundo patriarcal perpetuado ao longo das gerações. Declaradamente defensora de que a mulher tem o direito à independência financeira, à educação e à contracepção, Virginia não poupou esforços e muito menos palavras. Nascida ao final do século XIX e tendo o auge de sua vida e da sua produção literária no início do século XX, viveu o fim de uma época em que as mulheres escritoras ainda procuravam esconder-se sob um nome masculino, já que era o homem quem detinha e autorizava o acesso à escrita. Tendo as palavras como aliadas, a escrita foi sua forma de lutar contra uma vivência de submissão e conquistar um espaço para a fecundação intelectual e literária.

Mrs.
Dalloway, uma de suas obras mais importantes, que inclusive serviu de inspiração para o filme As Horas, foi publicado em 1920, um ano após as mulheres conquistarem o direito ao voto na Inglaterra. Fortemente influenciada por essas efervescências históricas, Virginia criou um romance em que as concepções e comportamentos de uma época são retratados na história de um dia na vida de uma mulher, Clarissa Dalloway, uma mulher habitada por angústias.

As personagens são traçadas de maneira definida, onde o homem e a mulher dividem o mesmo espaço, cada um exercendo o papel que a sociedade lhes concedeu. Mas é a mulher quem se destaca, pois parece que apenas ela tem a capacidade de sentir a vida, é ela quem tem emoções, pensamentos e questionamentos, como se houvesse espaço para ela no mundo. E as diversas personagens femininas que vão aparecendo ao longo da obra mostram, cada uma, uma faceta da condição da mulher, ora em comportamentos de submissão e desvalorização, ora em momentos de afirmação da autonomia e independência do feminino.

Enquanto Rezia é a personificação da submissão feminina – quando devota sua vida inteira e seus desejos ao marido Septimus, sentindo a necessidade de ter filhos não por querê-los, mas por uma exigência social – Sally Senton e Lady Bruton são o retrato da potencialidade feminina. A primeira, que desperta um sentimento estranho a Clarissa Dalloway, é apresentada como uma mulher audaciosa e temerosa: “absurda… completamente absurda (…), como se pudesse dizer o que quer que fosse, fazer não importa o quê”. Já Lady Bruton surge como uma exceção à condição feminina, mas ainda presa às amarras e poderes masculinos. Envolvida com política (exercício antes negado ao sexo feminino), tem uma visão crítica das mulheres, ela é “forte e marcial, próspera, bem-nascida, de impulsos diretos, de sentimentos positivos e escassa introspecção”, porém seu aparente desprendimento da submissão da mulher se revela superficial, quando por trás dela há a figura do homem, quando ela fala “como um homem” ou quando precisa da ajuda de um para poder redigir uma carta, já que questiona: “poderia o seu próprio pensamento revestir-se de tanta eloqüência?”.

A visão masculina das mulheres é encarnada em outros personagens, principalmente no solitário Peter Walsh, que, sofrendo de um amor não correspondido, descreve as mulheres como insensíveis, como seres diferentes dele e que não sabem o que é a paixão.

Mrs.
Dalloway é um eco de muitas das controvérsias que habitaram o meio intelectual londrino durante os anos 20, entre eles a questão do papel da mulher. A crítica social de classes, a burguesia e os efeitos da guerra também merecem o devido destaque, assim como a escrita singular de Virginia Woolf, que trouxe para a literatura uma inovadora forma de escrever: o fluxo de consciência. Porém, sua marca está, não só em Mrs. Dalloway como em toda sua obra, na ênfase ao feminino, na mulher, em sua condição e em suas lutas. Um verdadeiro contrapeso ao discurso masculino.

quinta-feira, 17 de maio de 2007

O Papa é pop, mas não papa ninguém

Que o Papa é pop todo mundo já sabe. Mas não falo daquele nazistinha que esteve por aqui dias atrás, mais conhecido como Bento XVI. Esse daí já cansou todo mundo. Falo sobre um também pop e muito íntimo das mulheres: o papanicolau.

Também conhecido entre os médicos por Colpocitologia oncótica, o papanicolau é um exame preventivo do câncer de colo de útero, que toda mulher deve fazer ao menos uma vez por ano.

Hoje, em todo o mundo, mais de 650 mulheres morrem por dia em consequência desse tipo de câncer. E as vítimas não são apenas as de mais idade, meninas jovens também são atingidas. Ele é o terceiro fator cancerígeno mais comum entre as mulheres, sendo superado somente pelo câncer de pele e pelo câncer de mama.

Normalmente, após serem realizados 3 exames anuais, a paciente com baixo risco fica livre para realizá-lo com menos freqüência. Porém, aquelas com pelo menos um fator que possa desenvolver o câncer do colo de útero, devem continuar se submetendo ao exame anualmente.

As mulheres não gostam de realizar o papanicolau, às vezes por vergonha, às vezes por ser extremamente incômodo, mas é essencial que seja feito, pois ele pode detectar outras doenças uterinas antes mesmo de um câncer se desenvolver.

O exame completo inclui primeiramente a palpação das mamas (para detectar o câncer de mama) e depois é introduzido na vagina um espéculo que possibilita a visualização do colo do útero. Em seguida, com uma espátula laminosa, o médico recolhe o material da parede uterina, que será enviado para um laboratório e depois analisado. Ele deve ser realizado pelo menos uma semana antes da menstruação, e devem ser evitadas duchas vaginais, colocação de cremes e relações sexuais três dias antes.

Podem ser causas de câncer: início precoce da atividade sexual, número elevado de parceiros sexuais, ter tido vários filhos, tabagismo, antecedentes de doença sexualmente transmissível e falta de higiene pessoal. Mas o principal causador disso tudo, em 90% dos casos, é um vírus conhecido como HPV (Papiloma Humano), uma DST que pode ser evitada, principalmente, com o uso de preservativos. Já existe, inclusive, uma vacina contra alguns tipos desse vírus, mas não custa prevenir.

Depois de toda essa chatice, há uma notícia boa: o papanicolau é oferecido gratuitamente pelo sistema público de saúde em qualquer unidade básica do SUS (Sistema Único de Saúde) e também em todas as faculdades de Medicina do Brasil.

Mulherada, ele tem nome de Papa, mas ao contrário desses sujeitos que vivem no Vaticano, ele pode salvar a vida de todas nós.

Instituto Nacional de Câncer: www.inca.gov.br