terça-feira, 15 de maio de 2007

Por uma alimentação politicamente correta

Mais do que um comportamento saudável, o vegetarianismo pode ser uma prática política

Antes tido como uma prática exótica, o vegetarianismo tem sido cada vez mais assumido como uma dieta essencial na vida das pessoas, seja de grandes centros urbanos, seja do interior ou de pequenas comunidades. Diversas são as publicações que tratam da alimentação vegetariana, assim como a quantidade de restaurantes especializados, que ao poucos vão se multiplicando, o que sugere o aumento contínuo da quantidade de adeptos.

A opção por uma alimentação livre de carnes (de aves, peixes, suínos e bovinos), ou de qualquer derivado animal (a alimentação vegana), pode ter inúmeras causas. Cada pessoa tem a sua em específico, que pode ser por motivos de saúde, religião, por respeito à vida animal e até mesmo por motivos mercadológicos, ou seja, por combate à indústria da carne.

De certa forma, todas essas causas estão interligadas, mas talvez a que seja menos levada em consideração é aquela que vai contra os interesses empresariais e contra a geração de lucros: a indústria da carne. É interessante, por exemplo, como o número de revistas especializadas em receitas vegetarianas é grande, porém, sempre enfocando a saúde, ou seja, aquilo que faz bem para o corpo do ser humano. Para se ter uma idéia, em uma das melhores livrarias brasileiras, são encontradas mais de 100 publicações com o tema “vegetariano”. E guias na internet com endereços de restaurantes vegetarianos são infinitos. Mas as questões ambientais, empresariais e de respeito à vida animal, são freqüentemente deixadas de lado. E estes deveriam ser, talvez, os maiores motivos para se levar o vegetarianismo a sério.

Assim como acontecia com os escravos, os animais são hoje tratados como simples mercadorias. Na condição de coisas, eles devem ser tão rentáveis quanto possível. Para se ter uma idéia, são mortos todos os anos mais de 8 bilhões de animais (16 mil por minuto), só nos Estados Unidos – o maior consumidor. O Brasil é um dos principais países exportadores de carne, onde, segundo Associação Brasileira da Indústria Produtora e Exportadora de Carne Suína - ABIPECS, existem cerca de 200 frigoríficos, responsáveis pelo abate de 36 milhões de suínos só em 2005. No mesmo ano, foram exportadas 9,2 milhões de toneladas de frango e 8,8 milhões de toneladas de carne bovina. Uma verdadeira indústria da morte altamente lucrativa. Segundo o Manifesto pela Libertação dos Animais, desenvolvido pelo professor de direito da Universidade de Rutgers (Nova Jersey), Gary Francione, “O 'sofrimento’ dos proprietários, por não poder usufruir a 'propriedade’ a seu bel-prazer conta mais do que a dor do animal”.

Para que essas empresas tenham esse alto desempenho, chegando a números elevadíssimos em sua produção, logicamente a estrutura delas é proporcional ao que produzem. Assim como o impacto que causam no mundo, desde poluição e desmatamento até o consumo elevado de água. Em números: os animais criados para corte produzem 130 vezes mais excrementos do que toda a população humana e um abatedouro de suínos típico gera excrementos equivalentes a uma cidade com 12.000 habitantes. Do total do solo cultivável, mais de 80% são utilizados para a criação de animais de corte; para alimentar um carnívoro, é necessário um terreno 20 vezes maior do que para alimentar um vegetariano. Sem contar o problema da água, já que a criação desses animais consome mais da metade de toda água utilizada no país. São necessários 9.463 litros para se produzir meio quilo de carne, sendo que apenas 95 litros produzem a mesma quantidade de trigo.

Os animais criados para a comercialização são alimentados com grande quantidade de vegetais e outros tipos de alimento, como a soja, que exigem grande área para sua plantação, o que é hoje responsável pelos maiores desmatamentos que temos no país. Ao contrário do que pensa a maioria das pessoas, a maior parte da soja plantada hoje no Brasil não se destina à alimentação humana, mas sim à alimentação de animais como bovinos e suínos, o que acaba por serem os próprios animais a causa de toda essa devastação. Certamente, se o consumo de carne pelos humanos não fosse tão elevado, a poluição do ar, da água e a destruição do ecossistema e dos recursos naturais não seria tão intensa.

E, além do problema do meio ambiente, essa estrutura montada para manter toda a indústria da carne acaba, mesmo que indiretamente, sustentando, ou se eximindo de pelo menos ajudar a resolver a questão da fome no mundo. Isso porque um terço da comida do mundo é utilizada para alimentar gado e outros seres para o abate. Esses animais consomem uma quantidade imensa de vegetais que poderiam nos servir diretamente de alimento. Se consumíssemos os grãos que cultivamos em vez de dá-los aos animais que futuramente também se tornarão comida, talvez estivesse resolvida, pelo menos em parte, a escassez de alimento no mundo. Para se ter uma idéia, 100 acres de terra produzem carne para 20 pessoas, mas trigo suficiente para alimentar 240. Seria praticamente impossível o planeta fornecer alimento para toda a população humana, se em todos os países as pessoas tivessem uma alimentação semelhante à da Europa e dos EUA – repleta de produtos de origem animal.

Para se manter vivo, o ser humano precisa se alimentar e, sendo esta sua atividade vital, a comida é facilmente passível de exploração pelos interesses do capital comercial mundial, como as grandes companhias multinacionais agrícolas, necessárias para manter esse meganegócio chamado agro-business. Assim, a indústria da carne, uma das questões discutidas dentro do vegetarianismo, praticamente não é levada a público, já que, se colocada em pauta, pode ferir os interesses comerciais dessas empresas multinacionais e, conseqüentemente, do governo. Muito mais do que um tema ignorado, o vegetarianismo não interessa como uma política governamental, ou seja, não tem e possivelmente não terá nenhum tipo de incentivo enquanto não tiver a potencialidade de gerar os altos lucros que a indústria da carne é capaz. Afinal, criar atritos com os maiores empresários brasileiros, ou de qualquer outro país, não faz parte dos planos de nenhum governo, que em qualquer lugar se preocupa somente com o dinheiro e o lucro.

Um comentário:

Anônimo disse...

Primeirão aqui!!!! Viva eu!!! Fui o primeirão!! Qto a alimentação politicamente correta, só posso dizer q sou comunista antigo q adora carne...
Parabéns!! Vai ser um blog muito legal.

papi