segunda-feira, 18 de junho de 2007

Senhorita boa de briga

Professora de boxe tailandês dá o exemplo de atitude e determinação em um espaço onde as mulheres ainda precisam se auto-afirmar

Andressa, ao meio, com suas alunas do Lady's Thai

Por mais que hoje pareça que chegamos ao ápice do nosso desenvolvimento, vivemos em um mundo onde as mulheres ainda são estereotipadas como símbolos da fragilidade e da sensibilidade e onde o masculino ainda impera no que diz respeito, também, à força. Andressa Saboya Prado, 22 anos, é uma dessas figuras que vêm para quebrar esses padrões machistas, difíceis de serem diluídos.

Natural da cidade de Santos, Andressa é professora de uma das artes marciais vistas como das mais violentas no ocidente: o Muay Thai. Conhecida como a “ciência dos oito membros” - por trabalhar com punhos, cotovelos, joelhos e pés – essa luta tem mais de dois mil anos de história. Assim como o futebol é nosso esporte nacional, o Muay Thai, também conhecido como Boxe Tailandês, é o esporte nacional da Tailândia. Conta-se que essa prática foi desenvolvida por camponeses e agricultores para defender a terra e o povo das ameaças de invasões constantes e que, inclusive, questões de política nacional foram decididas em lutas. Diferentemente do que poderia se imaginar, o treinamento sempre foi dado a todos: pobres, ricos, jovens, velhos, soldados e reis. Menos às mulheres. Antigamente era-lhes proibido chegar perto de um ringue, pois, sendo ele um país budista, havia um mito de que a presença delas era uma afronta às forças espirituais que protegiam o palco das disputas. Elas trariam azar aos lutadores e também aos espectadores das lutas.

Depois de muitos anos e avanços, hoje o Muay Thai não é mais restrito aos homens, mas o preconceito ainda reside de algumas formas. A luta feminina é muito nova e hoje, na Tailândia, as mulheres têm o próprio campo de treinamento, onde não se misturam com os homens. Aqui no Brasil, essa mistura existe somente em treinos, não em competições, mas ainda há a visão de que a luta é violenta demais para ser praticada por mulheres. Andressa, que já treinou vôlei, basket, handball e futsal, começou a lutar com 14 anos e diz que quando pisou pela primeira vez na academia para treinar, viu apenas um monte de homens sem camisa, suados, correndo para o aquecimento. “Não existia mulher treinando”, completa. O preconceito que sofreu foi no sentido de subestimarem sua força antes mesmo de senti-la ou de vê-la treinando. Isso a incentivou para que ela continuasse e se tornasse graduada em Boxe Tailandês.

Apaixonada pelo que faz, Andressa lutou muito ao lado de homens, ajudou bastante em treinos e, segundo ela, já ensinou “muito marmanjo por aí”. Então, resolveu montar uma equipe de treinamento para mulheres, o Lady’s Thai. A motivação foi a idéia de poder ensinar outras garotas a fazer a mesma coisa que ela, mas aprendendo com uma mulher, “algo que eu não tive”, explica. No início, a dificuldade era conquistar a confiança de meninas, que hoje são suas alunas, a acreditarem que ela estava ali pra fazer o que gostava e que realmente queria o progresso delas. Com o tempo essa confiança foi conquistada, e hoje Andressa dá aulas tanto em Santos quanto em São Paulo. A procura pelas aulas varia, tendo crianças e mulheres de mais idade com interesse pelo Muay Thai, mas a predominância é de jovens estudantes que encontraram um esporte onde podem ter seu espaço.

A luta para as mulheres não se diferencia praticamente em nada da que é ensinada aos homens. A única diferença se dá na utilização da aparelhagem: apenas na hora do treino com mais contato as garotas colocam um peitoral de proteção. Andressa gostaria de treiná-las para competições, mas é preciso insistir muito nisso, já que o esporte é bem cansativo e exige muita dedicação. “Mas já tive aluna que entrou dizendo que queria que eu a treinasse para subir no ringue”, afirma.

Depois de muitos anos dedicados ao seu aperfeiçoamento pessoal e ao ensino da luta, Andressa diz que hoje as pessoas a respeitam bastante, tanto pela graduação que tem, que não pode ser facilmente conquistada, e por ela realmente ter seu espaço para mostrar o que sabe e ensinar o que pode. Para ela, o crescimento na procura de mulheres pelo treinamento, assim como o respeito que adquiriu no meio, são o reflexo de que as mulheres estão cada vez mais se impondo na sociedade e quebrando tabus. “Estão cada vez mais corajosas”, conclui.

Hoje, o Muay Thai é uma das artes marciais mais usadas em termos de treinamento de segurança e autodefesa e, além de trazer um benefício mental e físico completo, “o poder de autocontrole sobre seu corpo, o crescimento e perceber que, cada vez mais a pessoa fica externa e internamente mais forte” é o que mais fascina a jovem professora. Que dá seu recado final: “Que haja sempre humildade, respeito pela arte marcial e pelo seu professor, não apenas levar como um treino comum e, sim, como um acréscimo interior, ajudando a ser a mulher que deseja”.

Curiosidades:
* Na origem, Muay = arte e Thai = livre ou pertencente à Tailândia.
* A luta chegou ao Brasil por volta dos anos 70, mas somente nas últimas décadas passou a ser mais popular.
* As faixas de graduação são chamadas Kruang e vão do branco (iniciante) ao preto (professor)
* As mulheres devem entrar no ringue pelo meio ou pelas cordas de baixo e não pelas cordas de cima, assim como fazem os homens.
* Na Tailândia, as lutadoras ainda não ganham as mesmas bolsas (em dinheiro) que os homens. Assim, a maioria continua trabalhando em outras atividades ou ainda tendo que conciliar as atividades domésticas com os treinos e lutas.

Lady’s Thai
Mazo Academia
Av. Pedro Lessa, 930 – Santos - SP
Academia Arena Fight Gold Team
Rua Augusta, 775, São Paulo - SP
Comunidade no Orkut:
http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=9450868

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